Os protestos contra o governo de Jair Bolsonaro (sem partido), realizados em todo o país no sábado (29/05), representou uma novidade no já bastante conturbado ambiente político nacional.
Foi a primeira vez, desde o início da pandemia do coronavírus no Brasil, em março de 2020, que um número significativo de manifestantes contrários à atual gestão tomou as ruas, rompendo um longo período marcado por atos políticos realizados apenas por simpatizantes do governo.
Os atos aconteceram em pelo menos 180 municípios, de 24 Estados e do Distrito Federal, mostrando que há uma ampla diversidade geográfica na parcela da população que se opõe ao atual mandatário.
Também contaram com vasta repercussão na imprensa internacional, com cobertura de veículos tão diversos como Guardian, Economist, Al Jazeera, Le Monde, NY Post, La Nación e Indian Times, contribuindo para ampliar o desgaste da imagem internacional de Jair Bolsonaro.
As manifestações de rua da oposição acontecem num momento em que Bolsonaro se vê pressionado pela queda de sua popularidade nas pesquisas de opinião mais recentes e pelo avanço das investigações da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que avalia a resposta do governo à pandemia que já matou mais de 461 mil pessoas no país.
Aumenta a 'fatura' do Centrão
Se têm visões distintas sobre as perspectivas para o impeachment, em uma coisa os analistas são unânimes: a demonstração de força da oposição deve aumentar o preço cobrado pelo apoio do chamado "Centrão" - grupo de partidos de centro-direita que costuma estar na base de qualquer governo do país, independentemente da posição ideológica, mediante troca de favores como cargos e verbas.
"Os políticos são sensíveis às mobilizações e entendem elas como uma forma de pressão da população", avalia Melo.
"Isso aumenta a 'fatura' do Centrão e também a possibilidade de o Centrão, depois que 'resgatar essa fatura', não entregar o que prometeu, porque o Centrão é antes de tudo pragmático", observa o analista.
"Conforme a perspectiva de reeleição entra em risco, esses setores tendem a abandonar o barco, para embarcar em projetos mais promissores. Tem uma frase do Tancredo Neves que diz o seguinte: todo político vai com outro até a sepultura, mas não se joga."
Claudio Couto, da FGV, também escolhe uma frase de efeito para falar sobre essa questão.
"Tem um ditado da política brasileira que diz que 'o Centrão ninguém compra, só aluga'", cita o cientista político.
"Essa é uma ideia interessante porque ela mostra o seguinte: o Centrão não está ali para ser um partido orgânico do governo, que vai apoiá-lo até o final. Ele é importante para a aprovação de projetos, para proteger o presidente, por exemplo, de uma tentativa de impeachment, mas ele é insuficiente quando o governo enfrenta dificuldades reais. Se o Centrão perceber que o barco está afundando, ele corre para outro lado."